sexta-feira, 30 de novembro de 2007

DECLARAÇÃO DE AMOR



Seu sorriso me ilumina
Como o sol que rompe o chumbo
De uma manhã de chuva.
Seu corpo é um caminho
Tortuoso que me perco toda noite
E onde não quero me achar.
Amiga, amada,
Carinho e luxúria
Unidos em um único ser.
Você.


sexta-feira, 23 de novembro de 2007

UMA BOA MORTE

Isso aconteceu há algum tempo, quando a avó da minha esposa faleceu. Eu apenas imaginava como poderia ser um velório e um enterro. Nunca tinha ido a nenhum. Antes disso acontecer eu não lidava muito bem com a morte. Mas depois dessa experiência eu passei a olhar esse tipo de ritual de outra forma, foi depois desse enterro que eu tive a real noção de como a morte é unicamente um comércio, seja ele capitalista, no real sentido da palavra, ou não.
Tudo começou quando recebemos a notícia que Dona Genoveva, internada fazia um mês, tinha acabado de falecer. Então saímos às pressas eu, minha esposa, seu irmão e a namorada dele. Ao chegarmos ao hospital encontramos seus pais, que estavam atordoados. J P, seu irmão estava alquebrado emocionalmente e as únicas pessoas com estado emocional o menos abalado possível éramos eu e minha mulher, então ficou para nós a árdua tarefa de tratar da parte burocrática do falecimento.
Depois de pegar o atestado de óbito, ficamos só eu e ela para receber o representante da funerária que cuidaria de tudo, o restante da família foi embora descansar. Ao chegar o funcionário, cheio de receio em falar conosco, já que não sabia como estaria o nosso estado emocional, foi avisando que teria de fazer algumas perguntas de praxe. Como um bom profissional do ramo tentou transparecer uma sensibilidade com a situação e começou a preencher um formulário com informações que ele disse serem importantes para tratar do enterro. Perguntou se tinha deixado filhos menores, se tinha algum bem, se tinha feito testamento, número de documentação, perguntas que num momento de tristeza como esse acabam se tornando inoportunas. Disse que não era para nos preocuparmos que a capela já estava reservada, o horário do enterro acertado e que não precisávamos nos preocupar que até a certidão de óbito seria providenciada, tudo muito eficiente, muito profissional, sugeriu que fôssemos embora que ele cuidaria da remoção do corpo, e tudo isso ainda no hospital. Eu ainda iria me surpreender com todo esse profissionalismo.
No dia seguinte fomos para a capela reservada velar o corpo, lá continuou a sucessão de comércio e “profissionalismo” a serviço da morte. Ao chegarmos havia algumas pessoas de branco anotando os nomes que estavam sendo velados. Não demorou muito para que uma delas entrasse em nossa “capela” oferecendo seus serviços espirituais. Disse que era de alguma dessas igrejas do divino alguma coisa e que se a família não se opusesse eles viriam meia hora antes do enterro para fazer uma oração. Claro, todo conforto espiritual ajuda nessas horas, mas ficar igual urubu procurando morto para divulgar sua crença, aproveitando a fragilidade emocional da família é um pouco mórbido, e não ficou só nisso.
Depois de muito choro e desejos de pêsames de amigos e familiares, veio um homem com o crachá da prefeitura, que com certeza estava acostumado a essa situação, disse com toda a frieza de seu ofício que era hora de fechar o caixão, ignorando os apelos da família, dizendo que estava na hora e que ainda tinha muito enterro naquele dia, não podia haver atrasos, nesse momento cheguei a uma conclusão: até para se morrer tem que marcar hora.
A capela ficava do lado de fora, então saímos todos e fomos num cortejo cemitério adentro seguindo a Kombi da prefeitura onde estava o caixão. No caminho paramos para comprar velas, flores e até caixa de fósforos, mesmos as tradições fúnebres são comercializadas hoje em dia. Ao entrar no cemitério parecia que todos haviam escolhido morrer no domingo, já que estava cheio e os caminhos do lado de dentro estavam de certo modo congestionados. Novamente alguns sensíveis religiosos de alguma assembléia de alguma coisa do reino não sei de onde ficava aos gritos apregoando sua fé para quem quisesse e não quisesse ouvir, interrompendo cortejos para entregar panfletos de sua igreja. Mais a frente outra cena inusitada; um homem com uma capa nas costas recebendo alguma entidade do candomblé.
E o cortejo chegou ao seu ápice: chegamos à cova que seria o descanso eterno da doce velhinha. Com toda sua presteza o funcionário público pediu que alguns homens presentes ajudassem-no a retirar o caixão do carro. Então a urna foi colocada dentro da sepultura e depois de algumas demonstrações de tristeza por parte dos familiares os coveiros começaram a jogar terra sobre o corpo. Tudo acabado um dos funcionários do cemitério, com toda a sutileza de quem faz isso todos os dias disse que poderiam colocar flores e acender as velas ali mesmo que não era proibido.
Bem, estava tudo acabado, fomos saindo devagar consolando a família, vendo os outros cortejos que se seguiam. Ainda estava no horário comercial e o dia estava cheio, os funcionários com aquele ar enfadonho de quem vai trabalhar numa segunda ensolarada contrastando com o ar de tristeza de pessoas que iam prestar sua última homenagem a seus entes mortos e assim a tarde foi se seguindo. Nesse momento me veio um pensamento um tanto mórbido e inoportuno; aquela tinha sido uma boa morte: não houve nenhum vexame de parente desesperado, ninguém, num ato de dor se jogou sobre o caixão, os funcionários fizeram seu trabalho como sempre fazem e tudo correu muito bem em mais uma tarde de segunda-feira no cemitério de Irajá.

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

ATO DE FÉ









Cura-se em nome de Deus.
Mata-se em nome de Deus.
Em nome da fé, curam-se chagas,
Conquistam-se graças,
Guerreiam por nada,
Eliminam-se raças.

Um só Deus e vários nomes.
Um desejo e várias crenças.
Religiões criadas por homens,
Que acham que suas leis fazem diferença.

Todos estão certos
E todos estão errados.
Por fé, todos ficam cegos,
Não aceitam que alguém pense o contrário.

Conquistam milagres com suas orações,
Arrebanham fiéis com suas pregações,
Constróem belos templos com suas doações
E matam em nome de Deus com armas e canhões.

Muçulmano, judeu, hindu ou cristão,
Muitos nomes com a mesma intenção.
Matam por nada, sem nenhuma razão,
Desde o início dos tempos
Nas terras de Abraão
E não se sabe ao certo até quando lutarão...

domingo, 11 de novembro de 2007

VAMPIRA




E fez-se a luz. Antes, havia apenas o nada, a escuridão. E a luz veio na forma dos cabelos vermelhos que surgiram diante dos meus olhos naquele trem do metrô. Não me lembro de nada que tenha existido antes. Como Adão, de repente tive consciência de mim e do mundo, simplesmente por ver aquela mulher. Toda ela era luz. Sua pele branca em contraste com o preto de sua jaqueta, seu corpo esguio que terminava em longas pernas de couro e salto. Tudo isso apareceu na minha frente como se tivesse se formado de uma nuvem de poeira.
Não pude deixar de olhá-la. E ela percebeu. Não ficou constrangida ou irritada. Me abriu um sorriso luminoso e disse qualquer trivialidade quanto ao calor ou a quantidade de pessoas no vagão. Não entendia suas palavras, apenas ouvia sua voz rouca e sensual penetrar em meus ouvidos como uma melodia doce que não sabemos de onde vem, mas que nos eleva aos céus. Eu, estava entorpecido. Parecia um idiota que ficava balbuciando palavras desconexas. Não conseguia articular um assunto, só ficava tentando entender como aquela mulher, misto de anjo e motoqueira, se dignou a falar com alguém tão sem graça como eu.
Me sentia como uma criança saltitante ao abrir a porta da minha casa e convidá-la, ainda meio sem jeito, para entrar. Não podia imaginar que um dia isso aconteceria comigo. Já tinha lido histórias como essa em revistas masculinas e nunca acreditei na conversa de uma desconhecida puxar assunto em algum lugar e aceitar um convite para ir a sua casa sem nem ao menos saber seu nome. Mas era isso que estava acontecendo. Eu não sabia o nome dela, ela não sabia a minha história e estava lá na minha sala bebendo meu wisky, vendo minhas coisas, entrando no meu mundo.
Como descrever um sonho? Como explicar algo que nem você consegue entender? Como nomear sensações nunca antes experimentadas? Não tenho palavras com que me expressar e só consigo narrar de maneira simples tudo o que aconteceu. Foi tudo inesperado, misterioso. Eu falava qualquer coisa sobre cinema alemão quando sua língua, sem nenhum pudor ou pedido de licença invadiu minha boca. A fúria do seu beijo me enlouquecia. Era quente, violento, sua língua era como uma serpente dançando na minha garganta. Minhas mãos percorriam seu corpo livre do couro que o cobria. Eu tocava seus seios intumescidos, ela tirava minha roupa com um apetite assustador. Sua mão tocou no meu sexo e o calor do seu corpo queimava minha pele numa ânsia de prazer e desespero. Eu penetrava sua gruta com meus dedos. Estava molhada, quente e seu desejo era tanto que seus gemidos ficavam presos dentro do seu peito. Ela se sentou no sofá e me ofereceu seu suco naquele cálice róseo. Ela apertava minha cabeça com suas pernas, sua respiração era entrecortada com suspiros e gemidos surdos, seu corpo se contorcia eletrificado e eu me saciava como um beduíno num oásis no meio do deserto.
Ela me pôs em pé e com olhos famintos segurou meu falo e começou a sugá-lo como se quisesse arrancá-lo, como se fosse possível tirá-lo do meu corpo e devorá-lo por inteiro. Minhas pernas começaram a perder as forças. Quanto mais intensas eram suas chupadas mais fraco ficava. Eu estava enlouquecido, não agüentava mais, tudo o que queria era me sentir dentro dela, daquela caverna úmida e quente, aconchegante e enlouquecedora.
Me sentei e ela subiu em mim como uma valquíria cavalgando em Asgard. Ela subia e descia cada vez mais rápido, cada vez mais forte, cada vez com mais intensidade. Eu sugava os seus seios, alisava sua bunda, sentia a penugem fina que cobria o seu corpo.
Não sei quanto tempo durou. Só tive consciência de alguma realidade quando no momento em que ela estava de quatro e eu a penetrava por trás seus gemidos surdos se transformaram num grito de agonia e prazer que me levou a loucura e inundei seu corpo com meu sêmen farto e viscoso. Ela se levantou, me lançou um sorriso e se dirigiu ao banheiro enquanto eu ficava desfalecido, sem forças, como um boneco de pano velho jogado no fundo do quarto.
Ela se foi. Todos os dias porém, nos encontrávamos no mesmo vagão do metrô e íamos até minha casa. Nos amávamos loucamente. Eu não pensava em mais em nada. Queria apenas que chegasse a hora de pegar o metrô e encontrá-la. Ela sugava minha consciência, minha energia, meus desejos. Não queria mais nada, apenas ela. Fui ficando cada vez mais cansado, cada noite era mais intensa que a anterior. Não tinha mais disposição para nada, somente para ela. Nada tinha importância. Deixei de trabalhar, comer, sair. Minha vida era agora ir pegar aquele trem e encontrá-la todo fim de tarde. Aquela mulher misteriosa que me consumia e que eu sabia sequer o seu nome. E esse mistério me excitava ainda mais.
Não ia mais ao metrô. Na hora exata, no fim do dia, abria a minha porta e ela estava lá, a minha espera, faminta de desejo, de luxuria. Eu não era mais nada. Um farrapo de mim mesmo. Não tinha mais vontade, não tinha mais desejo, não queria mais o dia, na verdade não via mais o dia, ela me exauria por completo toda noite e eu dormia o dia seguinte inteiro. Só existia a noite.
Fui me transformando. Não via mais prazer no dia, não pensava mais no trabalho, só queria saciar a fome daquela mulher. Com o passar dos dias vi que minha disposição estava voltando, mas só a noite quando ela chegava. Durante o dia continuava sonolento, cansado, não queria levantar da cama. E com o crepúsculo começava me animar porque sabia que ela iria chegar a qualquer momento para me alimentar com seu corpo, seus beijos, seu sexo. Não conseguia mais ficar sem esse ser misterioso em forma de anjo, ou demônio, não sei.
Mas enfim tudo acabou. E na última noite que a vi, ao se despedir, ela falou: você está pronto. Pronto para saciar sua fome. Saia e vá em busca de alimento, prazer, paixão. Adeus. Nunca mais a vi. Ainda tentei procurá-la no vagão indo de estação em estação, mas não a encontrei, simplesmente ela desapareceu tão misteriosamente como surgiu, como se não tivesse existido nem antes daquele e nem agora depois do nosso último encontro. Mas tudo bem, estou sobrevivendo e como ela disse fui atrás do meu alimento e agora estou aqui nesse trem de metrô procurando saciar a minha fome. Não sei o que aconteceu, só sigo meus instintos, meus novos instintos, então vou à caça...

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

"EU SOU DRÁCULA!"


Um personagem que sempre me fascinou (e com certeza a outras pessoas também) foi o vampiro. Presente desde de a Antigüidade no imaginário popular, ora como fonte de pavor, ora como entretenimento ele teve sua imagem propagada pelos quatro cantos do mundo através, principalmente pelo cinema.
Já na Grécia antiga existiam lendas de seres que se alimentavam do sangue dos mortais (os vikrolakas). Com o passar dos séculos essas histórias espalharam-se pela Europa Ocidental causando pavor entre os povos. E foi graças a literatura que essas criaturas começaram a deixar de ser seres putrefatos e assustadores para se tornarem charmosos, sedutores e... divertidos.
Muitos autores consagrados escreveram sobre o tema, Alexandre Dumas, Lord Byron, mas os textos mais significativos do século XIX foram Carmilla de Sheridan Le Fanu e Drácula de Bram Stoker. Já no século XX o nome mais representativo desse tipo de literatura era Anne Rice que escreveu as Crônicas Vampirescas que eternizaram personagens como Louis, Lestat, Armand e outros tantos vampiros fascinantes. Até no Brasil temos nossa linhagem vampiresca através de André Vianco e as histórias de Bento e os Sete.
E como a música sempre acompanhou a literatura, os sugadores de sangue se tornaram tema lá também. Bandas como Bauhaus compunha canções como Bela Lugosi is Dead. E com o crescimento de gêneros como o death e o black metal bandas como o Cradle of Filth não só usam os vampiros como tema como se apresentam trajados como tais.
No Brasil eles ganharam um tom mais divertido e sensual. Rita Lee cantou um vampiro sedutor alvo dos suspiros de sua amada. Já Léo Jaime ficou correndo atrás de Sete Vampiras que fez parte da trilha de filme homônimo nos anos de 1980 e quem, com 30 anos ou mais, não se lembra do hit Calada Noite Preta de Vange Leonel, tema de abertura da novela Vamp nos anos de 1990?
Então é isso pessoal, desde sempre os vampiros nos assustam, fascinam e divertem, seja no cinema na literatura ou na música. Se existem ou não eu não sei, mas por via das dúvidas ande sempre com um dentinho de alho e um crucifixo perto, nunca se sabe se aquele cara da sua rua que só se veste de preto e nunca é visto à noite é fã de Marilyn Manson ou está só esperando por um mole seu e morder seu pescocinho. Um forte abraço e fiquem com Deus.

(Texto anteriormente publicado na coluna Letra Literal do site http://www.vistolivre.com/ em 28/09/2007)